Foto: Noilton Pereira - @noiltonpereiraoficial |
Enquanto estavam lá, chegou o tempo de nascer o bebê. Ela deu à luz o seu primogênito. Envolveu-o em panos e o colocou numa manjedoura, porque não havia lugar para eles na hospedaria...” (Lc, 2: 6,7)
Há três anos seguidos que Jesus esperava pela visita do Papai Noel. Aquele bom velhinho de voz rouca, roupa vermelha e barba estranha, era assim que a professora Ana Célia, do colégio, descrevia o bom velhinho.
— Tia Ana Célia falou que Papai Noel mora no gelo e só vem uma vez por ano por estas terras porque aqui é muito quente — enfatizou Jesus com os olhos brilhantes. — Ele é da cor do corrupião, passarinho cantador.
Nas outras ocasiões, Jesus dormira cedo e por isto, não viu quando o Noel passou. Mas, dessa vez seria diferente. Iria completar nove anos, e ficaria acordado a noite toda, pois sonhava cada vez mais com seu presente: uma bicicleta.
— Quero uma biscleta encarnada... E sem rodinha — dizia Jesus.
A noite chegou devagarzinho, com sua fome de loba, ingerindo a poeira crepuscular do dia interiorano. A casa de taipa, chão de barro cru, mal rebocada com portas e janelas feitas de cipó e coberta por palha de carnaúba, era a morada de uma família de nove pessoas.
Jesus, de olhos atentos nos céus, nem quis jantar. Ceia? Não. Apenas uma mistura de feijão, arroz, farinha e peixe pescado no açude defronte a casa. Nada ali lembrava o natal das histórias dos livros, que eram lidos na escola.
Na casa com lamparinas acesas pelos cômodos, não tinha chaminé. “E por onde o Papai Noel desceria? E esse teto de palha, aguentaria a carruagem cheia de presentes e as renas do bom velhinho?” Pensava Jesus.
A cada “estrela cadente” o coração de Jesus disparava. Não era. A noite foi se engessando à medida que eram apagadas as lamparinas uma a uma. O urutau ao longe cantava melancolicamente, enquanto o rasga-mortalha cortava o silêncio e a escuridão da noite com seu canto fúnebre.
O frio começou a incomodar a esperança daquela criança que acreditava no sonho de ter uma bicicleta vermelha. Jesus deitado no tucum, armado debaixo do cajueiro, tinha os olhos fixos no céu estrelado. O corpo raquítico e desnudo começava a fraquejar.
Pouco a pouco a noite vencia Jesus. O galo já havia cantado três vezes, isto significava que era madrugada e as lágrimas quentes desciam pelo rosto frio do menino que soluçava, desaguando a criança que até então, habitava ali. Chorou. Chorou copiosamente. Sem presente em seu nono aniversário.
No terreiro, Jesus adormeceu.
SILVA, Marcello. Homo Cactus. Editorial Hope, 2018.
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