É um desejo, quase um cansaço. Mãos ao alto! Isto é um amor
escondido, um carinho perdido, uma promessa de estrelas. Prepare-se logo
para novos assaltos, iluminados como jamais viu. Invasões nas quais
trocam-se armas por flores, gritos por sussurros, defesas por clamores.
Novas aventuras se aproximam. Nesse mundo de pedras e podres, alguém
prega novos momentos e encontros brandos, assinalados um a um, no livro
branco da paz. A imundície foi posta a nocaute. O perjúrio, enjaulado. A
roubalheira diária trancafiada nos cofres de uma ética que se supõe
quase possível.
A algazarra dos sujeitos sujos em suas gravatas de serpentes de seda
envenenada, foi atirada aos leões do coliseu contemporâneo, onde
digladiam-se causas nobres e justas.
Mãos ao alto. Os ratos, morcegos e baratas recobertos na pele
cinzenta de monstruosos políticos receberão os primeiros raios de sol de
uma alvorada inaudita. Não há como escapar ao vaticínio.
Muitos fugirão para as sombras. Outros cavarão abrigos em terrenos
desérticos. Outros ainda se aninharão na intimidade dos cactos — pois
estes espinhosos contatos são os únicos destinados a quem urde baixezas
atitudinais em sua parca e estiolada existência. Mãos ao alto, Brasil!
Já tão murcho pelo débil anúncio de pálidas desesperanças. Há futuros,
não definhe! As crianças e os jovens prosseguem rindo à toa. Garantem
bonanças, brincando de roda por detrás de suas euforias rosadas. Há
mudanças neste ar, até então poluído de amarguras e desalentos. Reparem
só.
Há pássaros fortes e altaneiros, águias reais, condores suntuosos
adejando surpresas nesta terra de horrores, já desbotada, em seu verde
amarelo. Cores assustadas, tão esgarçadas quanto a primeira bandeira
cerzida nos séculos dos velhos imperadores por uma sinhazinha modesta.
Mãos ao alto! Joguem ao chão defesas, ressentimentos, maledicências.
Rejeitem desconfianças de toda a ordem. O amor existe e insiste em lhe
entregar uma flor. Não cerre os olhos. Não vire a cabeça no exato
instante em que caminhos férteis se delineiam devagar pelas mãos da
natureza em sua mais tenra infância.
Abrace a coragem de ostentar brilho nos olhos. O sorriso no rosto nu
de certezas, nas mãos vazias de crenças, que teimam, entretanto, se
manter estendidas.
Os lábios estão molhados à cata de paixões. O ar se cobre de um
desfile de gerânios, jasmins, girassóis, reivindicando no horizonte
perfumes esquecidos nos secos marcadores de livros. As flores do pântano
se acanham. Àquelas do sereno, se encolhem.
Mãos ao alto! Porque a primavera ergue seu reinado de sementes,
brotos de vida verde, devassando fendas de desusados terrenos.
Colheitas, aos poucos, se anunciam.
Preste atenção. Os corações agora saltaram para as mãos e correm
ávidos pelos bairros, acordam a vizinhança, assaltam casas tranquilas,
tocam acordeão em bando, despertam princesas sonolentas e príncipes
apáticos.
Este é o novo amor que se configura escaldante. Vermelho-fumegante
como tomates frescos, mesclados a uma sopa que revigora e alegra quem a
bebe.
Mãos ao alto! Estão de volta os doces e bárbaros sonhos, as amazonas
selvagens, os deuses da escuridão, dispostos a guerrear contra a
inocência perdida e as leis defloradas por seres do mal. O código da
vida é insone. Ouvem-se gritos pagãos de quem não teme a morte nem as
noites sem lua.
Mãos ao alto! Isto é um abraço. Então venha. Me abrace, me aperte,
rasgue a minha pele e a sua. Me morda e se entranhe neste amor ladrão.
A emoção bandida que nos inunda de quaisquer demandas e vícios do
corpo. É um afeto prisioneiro envolto em carícias e cárceres.
Creia. Este amor, dentro ou fora das grades, é o maior amor do
mundo. Por isso não perca tempo. Livre-se dos medos avulsos e prenda-se
aos seus mais belos afetos. Mas faça isso logo. Antes que chegue algum
ladrão sorrateiro.
Texto de Professora e Escritora Graça Taguti
Fonte: Revista Bula
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