Eu lembro do café do Seu Cazuza. Ficava no mercado, em frente a praça, entre o comércio do Seu Luiz da esquina e o depósito do Seu Almir. Tinha um fogão de alvenaria, um bule de café que fervia eternamente e o Seu Cazuza, figura pitoresca da cidade.
Contam que uma vez ele rasgou uma cédula de dez cruzeiros ao meio e deu metade para um cliente apressado que reclamava a demora do troco. "Toma teu troco fi duma égua, e arranca-te daqui". Foi lá que eu conheci o "esquecido", bolinho de goma inesquecível. Lá também eu conheci o bolo de milho, bolo de batata doce, o grude...O café do Seu Cazuza era o ponto de encontro cultural da cidade. Nas tarde-noites da minha infância eu ficava horas lá, ouvindo romance. Eu e várias pessoas que apreciavam este tipo de literatura e que neste tempo eu não sabia que era literatura.
Os leitores oficiais eram, ou o meu tio Lacô, ou o Tadeu do Seu Durval. Os tamboretes eram para os adultos mais velhos, menino ou ficava em pé ou sentava no chão. Como eu sempre estava pronto pra ir embora, era só ouvir o grito da mamãe lá da ponta da rua lá de casa, ficava em pé, num pé e noutro pra ir embora.
As vezes, esquecia o tempo, embalado pelas histórias: Jerônimo, o grande herói do sertão, as aventuras do vaqueiro Lucilane, o Pavão misterioso, as histórias de Pedro Malasarte...Todos ficávamos ali, torcendo pelos nossos heróis, heróis da minha infância. O silêncio só era quebrado quando o herói dava uma surra no bandido. "Toma seu filho da puta." Alguém logo fazia psiu e o silêncio voltava. Só se ouvia a voz do leitor narrando a história. Eu sonhava em ser leitor de romance no café do seu Cazuza. Quando a história era triste, dava pra ver, brilhando sob a luz do lampião petromax, as lágrimas que rolavam quentes nos olhos daquelas pessoas emocionadas.
Escrito por Atevaldo Rodrigues
Chavalense, Escrevo alguma coisa, mas sou melhor como leitor do que como escritor. Gosto de música. Gosto de cinema. Gosto mais do sertão do que da cidade.
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