Magro e faminto
lobo encontrou um nédio e gordo cão. Veio-lhe vontade de mandá-lo para o bucho;
mas o cão mostrava não ser dos que se deixam facilmente vencer. Mudou, pois, de
parecer, e tendo refletido, disse: Muito folgo, primo, de ver-vos assim tão
belo, e de pelo tão luzido, enquanto ando eu sempre magro e arrepiado. “Se
fizesses o que eu faço, tornou-lhe o cão, viverias como vivo. Moro em uma casa
em que todos me querem bem; tratam-me como um duque: e só tenho o trabalho de
ladrar à noite, quando dou fé de ladrões. Se te agrada esse ofício, eu te
apresentarei a meu amo, e, por mim recomendado, serás aceito”. O lobo não soube
como agradecer.. Puseram-se a caminho. Então reparou o lobo no pescoço do cão,
e perguntou-lhe: “O que é isto, primo? tens o pescoço esfolado?” — Não te dê
isso cuidado, tornou-lhe o cão; de dia, para que não morda aos que entram em
casa, prendem-me a uma corrente; porém de noite estou solto, e posso fazer o
que me dá na cabeça. — Então de dia estás acorrentado por semelhante preço não
quero a tua fartura; antes livre e faminto, do que cativo e farto.
MORALIDADE: Não
há cômodos nem prazeres que compensem o sacrifício da liberdade.
Fonte: ROCHA,
Justiniano José da. Fábulas (imitadas de
Esopo e La Fontaine)